Dom do Brasil, o samba faz 100 anos junto e misturado em todos os cantos
Dizem que o samba nasceu lá na Bahia. Outros garantem que o parto aconteceu nas imediações do Centro da cidade do Rio de Janeiro (RJ) entre a mítica Praça Onze e o seminal bairro do Estácio, berço de morros que gestaram pioneiros bambas cariocas como Ismael Silva (1905 – 1978). O fato é que o samba faz 100 anos entranhado em todos os cantos do Brasil. Tem samba nos quintais e nos terreiros que desencavam raízes de tempos idos. Mas também tem samba no jazz, no rock, no soul, no funk, no coco e até no pagode romântico. Por mais que puristas tenham tentando cristalizar um samba puro, o ritmo se espalhou, deliciosamente maculado, por todo o Brasil. E assim chega aos 100 anos de vida eterna.
O centenário de nascimento do samba é oficialmente festejado neste mês de novembro de 2016, porque foi no dia 27 de novembro de 1916 que Ernesto Joaquim Maria dos Santos (1889 – 1974) , o Donga, registrou o amaxixado samba Pelo telefone na Biblioteca Nacional. No papel, a autoria do samba costuma ser creditada a Donga e a Mauro de Almeida (1882 – 1956), oficializado posteriormente como parceiro. Contudo, a rigor, tal autoria é controvertida. O samba em questão pode ter vindo ao mundo por meio de criação coletiva. Mas isso já pouco importa. Como pouco importa a data da certidão de nascimento.
Não, o samba não nasceu na data do registro de Pelo telefone. O parto foi mais longo e o sêmen veio da África. Mas o embrião cresceu no Brasil, seja no Rio ou na Bahia. E daqui, do Brasil, partiu para o mundo, mesmo que o Tio Sam nunca tenha entendido de fato que o samba não é rumba. Mas ele logo compreendeu que a Bossa Nova era o samba tocado com a influência do jazz. E aí o samba ganhou os Estados Unidos e na sequência o mundo, porque, de acordo com o papa João (Gilberto), Bossa Nova nada mais é do que samba.
Mas não era assim desde que o samba é samba. O samba veio ao mundo por meio do suor de mãos negras. Lágrimas claras foram derramadas sobre peles escuras desde então para propagar essa tristeza que balança, como sentenciou o poeta, e que faz a alegria do povo. Teve muito samba triste nestes 100 anos, e como teve, mas samba, no imaginário coletivo, é sobretudo sinônimo de alegria, de confraternização, de gente reunida e feliz.
Bastam um violão e um surdo na marcação. E o samba renasce a cada dia, pois ninguém acredita nesse papo velho de que o samba acabou. Só se foi quando o dia clareou e o sambista foi trabalhar. Porque, de malandro, o sambista herdou somente a fama dos bambas da década de 1930. O poder da criação é exercido fora do horário do expediente. Mas, quando o samba vem, ninguém o segura. Ele se espalha logo, por todos os cantos, se misturando no meio do povo. E é assim que o samba faz 100 anos, junto e misturado, vivo, sem nunca ter agonizado. Porque o samba é o dom do Brasil.
Fonte: G1