Emanuelle Araújo já puxou trio elétrico, cantou pop rock, fundou a banda de samba Moinho e se apresentou ao lado da Orquestra Imperial, além de manter paralelamente a carreira de atriz. Agora, aos 40 anos, lança seu primeiro disco solo, "O problema é a velocidade", um retorno ao samba, mas também uma imersão na MPB.
Ela conta que sempre alimentou a ideia, mas nunca teve problema com a velocidade. "Fui muito preenchida pelos meus trabalhos coletivos. Eu gosto do coletivo, sempre estive rodeada por pessoas muito talentosas", explica.
Produzido pelo badalado Kassin, que já trabalhou com nomes como Adriana Calcanhotto, Los Hermanos e Erasmo Carlos, o álbum tem composições de Arnaldo Antunes, Zeca Veloso e Paulinho Moska, entre outros. "Pela forma como escrevem, dão força à palavra".
Com esta estreia, Emanuelle quer mostrar que não é só carnaval, rótulo que a "angustiava" na sua época de vocalista da banda Eva. "Talvez esse disco tenha aberto a porta para o meu romantismo, para lugares mais profundos da minha alma", avalia. "Ele é mais silencioso."
Enquanto também se prepara para lançar a novela "A lei do amor", em outubro, e o filme "O rei das manhãs" (em que encarna a dançarina Gretchen), em 2017, ela falou ao G1 sobre o caminho até o disco solo, a rejeição a estereótipos e o lado ruim da fama.
G1 - Você tem uma trajetória musical muito eclética. Qual a marca desse trabalho e o que ele traz de diferente dos outros?
Emanuelle Araújo - As pessoas têm uma avaliação de que eu sou uma cantora com uma relação muito forte com a festa. E eu sou mesmo, mas não só isso. Talvez esse disco tenha aberto a porta para o meu romantismo, para lugares mais profundos da minha alma. É um trabalho que é apenas meu. Não é só a Manu do carnaval, ele é mais silencioso
G1 - Depois de começar no axé e transitar por vários gêneros, como achou o caminho desse novo repertório?
Emanuelle Araújo - Não acho que estou chegando em algum lugar. Não acho que o disco chega, ele acontece. Eu sou muito concentrada no momento. O que está no disco é o que eu me tornei. Você vai amadurecendo, se apoderando de sensações, se empoderando de energia... É a Emanuelle de 40 anos.
G1 - Você tem trabalhos considerados sofisticados, como as participações na Orquestra Imperial, mas também é uma artista popular. O que acha dessa distinção?
Emanuelle Araújo - Não gosto de rótulos. Quando alguém me encaixa numa prateleira, tenho que ficar respondendo as expectativas dessa prateleira. Estar fora disso me dá liberdade. Quando fui cantora de carnaval, era considerada só isso, o que me angustiava, porque eu não era só isso. Me considero uma artista da música popular brasileira, e isso abrange muitas coisas. O mais maravilhoso é alcançar, comunicar, chegar ao público.
G1 - Por que demorou tanto tempo para lançar um disco solo?
Emanuelle Araújo - Sempre tive esse projeto na minha cabeça, mas nunca tive pressa porque sempre fui muito preenchida pelos meus trabalhos coletivos. Eu gosto do coletivo, sempre estive rodeada por pessoas talentosas, desde a Bahia [como vocalista da Eva] até a Moinho. Eu queria que o disco acontecesse na verdade de um momento, em que eu pudesse estar dedicada a isso. Agora eu senti que era hora. O caminho foi natural. Fui com calma, procurando os compositores, buscando antes de mais nada ter um repertório. Esse álbum brota da maturidade do meu momento.
G1 - Como chegou nesse time de compositores?
Emanuelle Araújo - Eles partem do meu afeto, seja por admiração ou porque têm uma relação de amizade comigo. Eu já tinha uma sensação de que o disco partiria da palavra, da poesia. Queria muito entender o que eu queria dizer. Por isso, convidei poetas, músicos que, pela forma como escrevem, dão força à palavra. De conversas íntimas, saíram as canções. Esse disco acabou criando uma cara própria de forma natural e sincrônica. As músicas têm uma relação, conversam entre si, mesmo sem isso ter sido programado.
G1 - Estar na TV e no cinema alavanca sua carreira musical? Ou o contrário?
Emanuelle Araújo - Esse é um pensamento mais de produtor. Eu sou artista, não penso nessas coisas. Não faço um trabalho pensando nisso, faço porque me interessa, porque acho que pode me acrescentar. Não penso em questões empresariais. Eu acho que ser regido por esse tipo de coisa é perigoso. As consequências eu recebo de braços abertos.
G1 - Está mais difícil ser artista no Brasil conturbado de hoje?
Emanuelle Araújo - A gente se inspira nos conflitos. Eles nos fazem ir mais fundo ao pensar sobre o que está acontecendo. A arte também parte da crise. Acho que em momentos difíceis podem acontecer coisas maravilhosas. Mas isso requer coragem. Precisamos estar atentos, fortes e sensíveis à verdade das coisas, ao coletivo. Ser artista no mundo é um ato de coragem. Ser artista num momento de crise é um ato de coragem, força e poder.
G1 - Acha que está faltando coragem no meio artístico?
Emanuelle Araújo - Quem sou eu pra dizer o que falta? Não me levo muito a sério para dizer isso. Percebo que as pessoas estão pensando mais. O que eu desejo é que o pensamento não fique só na superfície, que vá fundo, que as pessoas busquem pesquisar, saber mais sobre tudo.
G1 - No ano passado, você gravou com Nanda Costa ‘Me erra’, uma música que fala sobre desvantagens na fama. Em que medida a falta de privacidade te incomoda?
Emanuelle Araújo - Para falar a verdade, isso não me afeta tanto. Meu jeito de ser é tão simples, claro e direto que eu sinto que a imprensa me respeita bastante até. Eu passo por essas coisas sendo direta e franca. Lido com todas as pessoas do mesmo jeito, isso me conforta. Essa glamourização da vida pessoal depende muito de como o artista se comporta.
Gonte: G1