A Banda Eva mudou. São mais de três décadas de história e seria impossível acreditar que tudo continuaria da mesma forma que era no princípio. Com Saulo Fernandes à frente do grupo há dez anos, o Eva se mantém como um dos mais conhecidos grupos do País. Em entrevista exclusiva ao Terra, o vocalista contou um pouquinho sobre o rumo da banda, seu dia a dia e sobre as "conversas musicais" que vem tendo com outros músicos e compositores.
Pesquisador de música, Saulo conta que, a cada dia, descobre bandas novas e se deixa influenciar por elas. Entre os brasileiros em que o músico se inspira figuram nomes como Nando Reis, Maria Gadú, Novos Baianos, Mombojó e Chimbinha, do Calypso.
Confira abaixo a entrevista completa feita com o vocalista da Banda Eva.
Terra - O som que você estão fazendo agora é diferente do que a Banda Eva fazia há algum tempo. Vocês querem mudar o foco musical?
Saulo Fernandes -O que acontece é que, com a democracia geral, com a liberdade musical e com a comunicação total que a gente tem, o cabeção abre mesmo. A gente não quer mudar de rumo. A gente quer manter a tradição da história do Eva. O som vem se modificando, mas vem se modificando com coerência. As claves da percussão vêm desde lá dos primórdios, do Carnaval, da música africana e tudo mais. Então, a gente sempre tem a percussão como base, porém, tudo o que viemos aprendendo com esse tempo, todas as conversas musicais, a gente agregou ao nosso som. É o que eu chamo de 'comunicação atabaque'. É exatamente isso. A gente mantém a raiz, que é a percussão, e a gente se comunica agora de forma mais abrangente.
Eu não sinto que é uma mudança. Eu sinto que é uma coisa do caminho, da estrada normal, e de a gente aprender também. O grande lance é aprender com o outro. Queremos manter a percussão mas queremos a guitarra também, queremos novas influências. A gente quer ouvir o que Nando Reis tem a dizer, o que Maria Gadú tem a dizer. A gente sabe, mas quer ouvir isso através da música.
Vocês farão um show fechado em São Paulo só para poucos convidados. Nessa apresentação, Nando Reis e Maria Gadú são alguns dos convidados para subirem ao palco com o Eva. Você se inspira em algum deles?
Totalmente. Nando, sobretudo. Nando é um cara que escreve lindamente e é um cara que tem uma história muito linda de música. É um cara bacana, que tem vibrações positivas. Ele sempre foi uma influência muito grande, sobretudo na questão das letras. Maria é uma doçura. É uma coisa linda que aconteceu e que tem uma proximidade com a gente também que se deu através da música. Não foi nada forçado, não. Maria sempre canta Eva no repertório dela. É uma música tradicional da gente: "Meu amor, olha só...".
Então, sabe essa coisa de identificação? A gente se encontrou no Festival de Verão de Salvador, no mesmo palco, e a gente conversou. E o engraçado é que em conversa de músico, a gente não sente nenhum tipo de rótulo, nenhum tipo de barreira, nenhum tipo de nada. Então a ideia é essa: que a gente se influencie por essas pessoas e que a gente aprenda e coloque no nosso som.
Martinho e Duda também são duas pessoas que a gente conhece a história. Recentemente eles lançaram um disco e eu tive acesso a esse disco. Sempre admirei os meninos, que trabalham com Pitty, e outras coisas que eles faziam antes em Salvador. Então é exatamente isso: querer aprender com eles.
Por que um show pequeno?
É um show específico. A gente chama de 'Eva Private', e a gente vai convidar esses amigos para fazer um show com a gente. O repertório é a banda reduzida - menos percussão e menos sopro - e vamos tocar as canções do Eva normal, só que a gente fez algumas adaptações com Novos Baiano, Gilberto Gil, se comunicando com o Nando, com Maria, com Martinho e com Duda pra fazer alguma coisa mais abrangente mesmo. Uma coisa mais musical.
E por que show fechado? Vocês irão apresentar algo novo da banda?
A gente quer ir a São Paulo e fazer um show em um lugar bacana e convidar umas pessoas bacanas. Não tem nada estratégico, nada tendencioso. A ideia é fazer uma festa e cantar com essas pessoas que a gente admira e tocar música.
Seria, então, um show mais para vocês do que para o público?
É. Acho que termina sendo assim. O que acontece é que algumas pessoas que gostam do Eva vão estar lá. Mas é um show que... Engraçado você falar isso. Porque enquanto a gente estava ensaiando, falamos: "Meu Deus. Acho que vamos sentir mais prazer nesse show do que todo mundo", porque a gente gosta de fazer mesmo. Tentar se comunicar, da forma mais honesta, através da música.
Você tem alguma banda favorita?
Cada época tem uma. Minha última banda favorita foi The Strokes. É totalmente curioso porque eu acho lindo, cara. Aquelas melodias eu acho demais. Na minha lista tem os Novos Baianos sempre, tenho ouvido os discos de Brown, Mombojó, que é uma banda linda também e rica de letra e tudo mais. Aí eu ouço The Congos, Blick Bassy, Cake, Ponto de Equilíbrio, Maxwell, eu ouço muito reggae também. Eu sou inquieto. É minha função mesmo. Eu sou um servo da música. Estou o tempo todo querendo crescer nisso e aprender.
Você costuma escutar suas músicas também ou mais de outros artistas?
Eu sou um pesquisador de música. Então eu fico o tempo inteiro querendo saber o que está acontecendo. Eu vi, um tempo atrás, uma parada que eu acho que é de São Paulo - Curumim - que eu fiquei pirado. E tem a Sara Tavares, que é de Portugal. Então eu vou pesquisando. Descobri uma banda americana que eu estou adorando que chama Cake. Eu vou pesquisando e sempre querendo saber das coisas. Os africanos sempre me interessam muito. Então, eu sempre ouço muito mais música do outro - Chico, Caetano, Djavan. Na verdade, eu sempre busco muito mais o outro do que a mim. Sempre acho que o outro vai me ensinar tudo a qualquer momento.
Tem algum ritmo que você não gosta muito?
Eu não costumo definir uma música pelo estilo. Sendo uma música honesta, eu não consigo rotular sem escutar antes. Eu ouço. Se me emocionou, eu adoro. Chimbinha, por exemplo, é uma coisa que me emociona. Os timbres de guitarra, aquelas coisas bem tradicionais. Tudo que é enraizado me emociona muito. A gente fica tão chato quando a gente fica segmentando. Música é tão maior que isso.
No Carnaval, Ivete cantou uma música para você,no trio elétrico, com toda aquela gente em volta. O que você sentiu naquele momento?
Primeiro, fiquei morrendo de vergonha. A segunda sensação é que, toda vez que eu encontro com Ivete, a gente sente borboleta no estômago, sabe? Sentimos que alguma coisa vai acontecer e a gente fica "tenso". Ivetinha é coração total e, naquele momento, acho que ela queria segurar o choro também e foi lindo. Foi um dos momentos mais lindos da minha vida e, só ela, só Ivete consegue me proporcionar emoções tão fortes por causa da luz que ela tem tão gigante. Sou eternamente grato a todos os encontros com ela. Por tudo que ela tem feito, fez e faz.
Mas você prefere o palco ou trio?
São 2 situações diferentes eu me emociono demais no trio elétrico, sobretudo o Carnaval de Salvador. Você tem uma manifestação honesta das pessoas e isso me emociona muito. Mas o palco, a precisão do palco é uma coisa que me instiga. Eu gosto de ficar ali, preso aquelas duas horas. Eu gosto disso aí. E eu gosto de cantar, né? Eu sou passarinho que acorda de manhã e canta. Então, em qualquer situação que tiver um microfone ligado eu gosto de cantar. Gosto das duas coisas. Não tenho preferência não. Eu gosto de emocionar as pessoas com a música.
Como é a rotina da banda? Vocês estão preparando algo para um futuro próximo?
A rotina é a estrada, mas a gente vai lançar um disco no segundo semestre. Então alugamos uma casa e a gente fica, sei lá, seis meses produzindo, compondo, arranjando as canções e descobrindo novas cores, novos sons e tal. A rotina, agora, é essa.
Fonte: Terra Música